“Síndrome respiratória” dispara no Instagram em maio


A linguagem, como sabemos, é viva. Muito viva. E é interessante como o vocabulário da polarização política passou a ser evitado coletivamente em nome de uma construção social de uma saúde coletiva. É o caso, por exemplo, do que ocorre com o termo “síndrome respiratória”. No Instagram, no mês de maio de 2025 (Gráfico extraído da Content Library – Meta), dispararam as menções à expressão, em compasso com o aumento de casos de SRAG (síndrome respiratória aguda e grave).

Menções a “Síndrome respiratória” no Instagram, de janeiro a maio de 2025. Fonte: Content Library, Meta. 

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Até aqui os 3.408 posts no Instagram com o termo “síndrome respiratória” já geraram 146 milhões de visualizações, 126 mil comentários, com destaque para os canais de imprensa, que passaram a reportar o efeito do problema (o aumento de casos e internações por infecção respiratória) e entraram em campanha para a solução (a vacinação).

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Termo ‘gripe’ se torna o mais correlacionado à vacina em maio de 2025. Fonte: Pysa / Labic, Ibict.

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É uma estratégia de linguagem colaborativa para afastar as polêmicas muito presentes no vocabulário polarizado da covid. E a ‘gripe’ passou a se conectar à vacina em maio (apesar da ambiguidade com ‘gripe viária’, outro problema que vive o país), como podemos ver na imagem do painel Pysa_vac (em desenvolvimento pelo Labic / IBICT).

Nitidamente, há uma tentativa de canais no Instagram de se aliarem no enfrentamento da circulação dos vírus que provocam infecções respiratórias fazendo educação midiática em tempo real (com lives, testemunhos de especialistas, testemunhos de pacientes, notícias e alertas), ao adotar o termo ‘síndrome respiratória’ como estratégia de ressignificação para mitigar o comportamento de desdém acerca das medidas de contenção do vírus (em especial, a vacinação contra a gripe).

Rede de canais que reportam posts com o termo “síndrome respiratória” no Instagram. Superlotação em hospitais, falta de leitos, campanhas oficiais de vacinação e dificuldades para a população se vacinar são temais mais frequentes do que difusão de desinformação sobre infecções respiratórias. Fonte (Pysa/Labic, 2025)

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Como aponta a imagem a seguir, essa profusão de postagens na principal rede social brasileira fez aglutinar sete bolhas de usuários no Instagram, cujos principais temas estão conectados ao bigramas presentes no gráfico de barra. Reparem que é a narrativa de emergência e aumento de casos que molda o sentimento político sobre o tema.

São sete os grupos que colaboram na conversação pública sobre o tema. Nas imagens, é possível ver, em detalhe, a rede rosa, onde estão o Ministério da Saúde, Léo Dias, Átila, Floripa Mil Graus, Dr. Francisco Cardoso, Zero Hora, Itatiaia Oficial e Dra Aline Quental, que funcionam como grandes hubs para comunicar a situação de emergência em função da gestão das internações (em especial a superlotação por causa da limitações no número de eitos) e os processos de prevenção de saúde.

Na imagem a seguir, podemos ver as principais palavras utilizadas por esse grupo. É uma rede de aliados pela vacinação que articula um discurso que realça as medidas mitigatórias e o alerta à situação complicada de lotação dos hospitais em função de aumento de casos de infecção respiratória (destaque para Minas Gerais e Santa Catarina).

Já a rede azul faz destacar a narrativa de riscos e complicações, em função da baixa vacinação e falta de leitos de hospitais. Esse tipo de situação fez com que o prefeito de Goiânia, Sandro Mabel (mais à centro-direita no espectro político), viralizasse no Instagram, com um vídeo de apelo à vacinação num estilo “pagando geral” para a população: “Nós não vamos ter leitos de UTI se vocês não se vacinarem. Os leitos são os mesmos para quem tem enfartes e outras doenças graves. Agora, não vacinam crianças, idosos, grávidas, não vacinam ninguém. Estamos com o índice de cobertura baixíssimo”, se indignava.

O post do prefeito revelou-se como laboratório de grupo focal sobre o desafios da vacinação no país. Nos comentários, a população pontuou que a principal dificuldade do usuário do SUS é se vacinar em horário de trabalho, pedindo que os postos de saúde tenham horários mais flexíveis à jornada de trabalho das pessoas, além de relatos de falta de funcionários capacitados nas salas de vacina. “Prepare pontos de vacinação de fácil acesso ao trabalhador para quem cumpre jornada de trabalho de mais de 10 horas por dia”, dizia um dos comentaristas mais curtidos na publicação.

Mas foram os comentários negacionistas que ganharam mais reações nas caixas de comentários ao plantar dúvidas sobre a vacinação contra a influenza, revelando que há um modelo mental sobre vacinação que se aplica continuamente nos discursos digitais. Ao se falar de vacinação, sempre vai haver usuários que repetem o discurso que a vacina não serve pra nada. Exemplos disso: “Não se vacine. Perdi amigo por trombose”. “Os enfartados foram os que se vacinaram. Caia nessa povão.”, “Não vacinei e nem vou vacinar”. “Não vacinem! Além de não prevenir ainda causa vários efeitos colaterais!!!”, “Ah tá e quando der AVC e Trombose ? Vc assume o risco que vem na bula da vachin@? Affff q prefeito meu Deus ! Aterrissa , já existem N países que proibiram isso e aqui é esse retrocesso”.

Esses comentários são feitos para atrair engajamento em número de likes através da geração de instabilidade emocional de um audiência online, que, ao reagir comentando, tornando esses comentários mais ‘relevantes’ e, logo, mais vistos no Instagram. Ou seja, é bom que gestores e influenciadores eduquem diretamente suas audiências online para que elas não caíam no bait do troll negacionista. Sem dúvida, insistir num léxico comum (como “síndrome respiratória”) é um bom sinal para evitar falsas polêmicas polarizantes.

O uso do léxico “síndrome respiratória” ainda não é usual para o ministro @padilhando (ainda que seja para o @minsaude), que teria a oportunidade de usar o termo (mais neutro) para comunicar mais os riscos, as medidas epidemiológicas e os indicadores de vacinação em seus canais de comunicação (que, aliás, andam muito bem no Instagram). O mesmo pode ser dito para os grupos de oposição (federal ou locais), que podem ter no tema uma oportunidade para exigir mais celeridade da vacina no braço das pessoas (como aconteceu no caso da dengue) através de medidas concretas de gestão (como o caso da flexibilidade de horários dos postinhos).

Para quem curte análise de rede, tome nota do que eu fiz. Optei por fazer uma rede formada pela díade palavra-canais. Levantei todas as palavras escritas em posts e imagens com os termos ‘síndrome respiratória’ e ‘srga’, depois interconectei-as com os canais que as utilizaram. Depois disso, no Gephi, clusterizei-as, usando a estatística de modularidade, mostrando que há palavras que interessam mais determinados grupos de canais do que outros. Também trouxe para o Laboratório de Dados do Gephi os dados de interações dos canais (interação por post, por ex), como atributos dos nós, o que me permitiu visualizar quem está dirigindo o sentimento público sobre o tema.

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